Reconstrução foi tema abordado por Salgado, Campello, Eurico e Dinamite em suas cerimônias de posse
Quarta-feira, 27/01/2021 - 12:47
Quatro presidentes, 12 anos de mandatos, promessas parecidas e o mesmo diagnóstico: a necessidade de reconstrução do Vasco. Roberto Dinamite, Eurico Miranda, Alexandre Campello e Jorge Salgado, em seus discursos de posse, apontaram praticamente os mesmos problemas e indicaram soluções semelhantes. É a prática nas ações que vai definir a sorte do triênio de Salgado.

Desde 2008, o cenário pouco muda mesmo que cada gestão tenha o seu perfil. Tanto o é que o sucessor repete a fala do sucedido, obviamente, com alterações dado o contexto de cada época. Ouvir Salgado, na posse de segunda, teve um quê de ouvir Campello, Eurico e Dinamite.



O ge revisitou os discursos, exemplos da divisão política e da tumultuada vida eleitoral do clube de São Januário. São também reflexos do enorme rombo financeiro e consequente queda desportiva - campeão três vezes nesse período, rebaixado para a Série B também em três oportunidades.

A necessidade de união e a retomada de conquistas são declarações campeãs de bilheteria. O gráfico abaixo, em números compilados pelo jornalista Rodrigo Capelo, mostra a evolução da dívida vascaína no momento das posses de cada um dos presidentes (não contempla o último ano da gestão Campello, pois estes ainda vão ser fechados).

Antes de passarmos aos discursos de cada um, Capelo comentou a evolução da dívida do clube, caso que sempre gera contestações entre lados diferentes da eterna briga política no clube de São Januário.

- Quando a gente analisa a evolução do endividamento do Vasco precisa tomar cuidado. Porque os balanços financeiros anteriores a 2018 não eram confiáveis. E eu puxo os dados do balanço de 2017, cuja a auditoria externa, a Anend, contratada por Eurico Miranda, apontou que apenas entre as dívidas R$ 580 milhões não puderam ser verificados. Ou seja, este valor poderia ser muito maior. Então o que houve, na verdade, não foi disparo da dívida do Vasco de um ano para o outro. E, sim, sujeira que estava escondida debaixo do tapete - disse Capelo.



* Sobre este gráfico, é preciso registrar que Dinamite entrou em agosto de 2008, depois de decisão judicial. Em 2007, segundo ano do novo mandato de Eurico, o Vasco registrava em balanço dívida de R$ 167 milhões (faturamento era de R$ 39 milhões). O grupo de Dinamite contestava as contas - e reclassificou as dívidas até apresentar o primerio balanço, o de R$ 356 milhões, referente ao ano de 2008

Voltando a Salgado.

Nos seus pouco mais de 10 minutos de fala, o novo presidente apontou duas vezes que o Vasco vive um "processo de decadência". Recolocar o clube como "potência futebolística" e fazê-lo ser "protagonista nas competições" foram expressões usadas em outras outras quatro oportunidades. A crise financeira e suas variações foram citadas sete vezes e a ideia de tornar o clube mais unido e amigável, três.

Roberto Dinamite (posse em 2008)

Depois de três mandatos consecutivos de Eurico - o último deles interrompido depois de longa briga judicial pela eleição de 2006 -, o ex-jogador e ídolo Roberto Dinamite chegou à presidência. Assumiu o clube na temporada que terminaria com o primeiro rebaixamento - ele seria reeleito, campeão da Copa do Brasil em 2011 e rebaixado mais uma vez em 2013.

O contexto da época era de renovação, após muitos anos de domínio de Eurico. Tanto que Junior, ídolo rubro-negro e vizinho de Roberto, e Márcio Braga, então presidente do Flamengo, foram à cerimônia. Dinamite falou que a união dos clubes e interna poderia ajudar a resgatar momentos de glórias e conquistas. E, claro, abordou a reconstrução:

- Se Deus quiser, esse momento aqui é de união de todos nós. Para que possamos levantar e dar aquilo que os torcedores desejam: dignidade e respeito à nossa instituição.

Outras frases de Dinamite

- Vamos buscar os parceiros que se fazem necessários, mas vamos ter sempre amor, suor e competência para administrar o Vasco. É dessa maneira que vamos recuperar e resgatar tudo o que queremos.

- Vamos escrever uma nova página. Agora será um Vasco sem censura, sem lei da mordaça. O Vasco vive um momento delicado, principalmente em sua administração.

Eurico Miranda (posse em 2015)

A decisão de voltar, nas palavras usadas por Eurico no discurso, foi por sua vontade de resgatar o Vasco. Três anos depois, a sua chapa para a reeleição tinha o nome "Reconstruindo o Vasco". No discurso, Eurico fez metáforas de reerguimento do clube:

- O clube padece do mesmo mal de outrora, está internado com os mesmos sintomas de quando nele cheguei. Foi entregue ao segundo plano, diminuído, desrespeitado. Isso é percebido no comportamento dos nossos torcedores, que aceitam de forma resignada o falso destino que tentam nos impor. Resgatar esse respeito é a nossa primeira missão. Isso sem dúvida ocorrerá em pouco tempo. Não será fácil, mas é o momento de preparar os alicerces do futuro.

Eurico chorou, agradeceu à família e até disse que desejava melhorar a relação com a imprensa. Citou as dificuldades financeiras, mas não tratou tanto de união política. No seu mandato, o clube ganhou duas vezes o Carioca, mas caiu para a Série B em 2015.

Outras frases de Eurico

- Passei por diversas funções até que um dia cheguei a posição na qual sabia que poderia mudar esse sentimento de inferioridade. Foram mais de 20 anos recuperando a auto estima do Vasco. Se fiz algo nesse clube, além de auxiliar na conquista de títulos históricos, foi devolvê-lo à sua origem. Não fiz o Vasco grande, mas o lembrei de sua grandeza.

- É natural que precisemos dispor de remédios amargos, controlar gastos, compor dívidas fiscais, negociar dívidas avulsas, recuperar a credibilidade. Isso está longe de significar que não trabalharemos com vista de disputar as competições com equipes competitivas. Equilibrar necessidades e desejos é a forma ideal para atingirmos nossos objetivos.

Alexandre Campello (posse em 2018)

Campello chegou ao poder em uma construção política - arregimentada pela força de Eurico Miranda - do Conselho Deliberativo que desrespeitou pela primeira vez na história o voto direto do associado - Julio Brant foi o mais votado pelos sócios. O médico também usou metáforas de um paciente em dificuldades. Com o discurso da profissionalização como remédio para a melhora, clamou pelo fim da briga política - que ajudou a intensificar com rompimento com apoiadores meses depois.

- Quando falo em união, me refiro a todos aqueles genuinamente vascaínos que colocam o Vasco acima de quaisquer interesses pessoais ou políticos. Pessoas como estas encontramos em todas as correntes políticas. Entretanto, desde 1984, quando comecei a trabalhar no clube, vejo o Vasco dividido entre grandes forças cujo o embate feroz funciona como anestesia ministrada ao Gigante da Colina. Anestesia que entorpece seus membros e torna mais lento os seus passos. O clube é jogado em um ciclo no qual mal se encerra uma disputa eleitoral e se inicia outra. Os ataques e sabotagens não cessam, e o gestor perde preciso tempo nessa lida. O ódio ao adversário interno supera o amor ao Vasco - apontou.

O Vasco não ganhou nenhum título e sempre lutou contra o rebaixamento no Brasileirão.

Outras frases de Campello

- Quero promover grandes mudanças dos métodos e no estilo da gestão vascaína. Isso, por certo, será um processo paulatino. Irá respeitar as tradições e instâncias, mas não pode se furtar de remover os obstáculos que travam a construção de um clube cada vez mais moderno, democrático e poderoso. É o legado que quero deixar para as próximas gerações de vascaínos. Precisamos modernizar o estatuto e os processos sucessórios. Os vascaínos precisam tomar o destino do Vasco.

- Sei das dificuldades, das dívidas e da baixa receita, mas sei também que não estou sozinho. Valorizarei os conselhos. Vascaínos e vascaínas, abracem o Vasco e façam onda de amor em prol de um Vasco unido e forte. A eleição de janeiro foi a expressão por mudanças e dias melhores. Garanto: nossa gestão honrará essas esperanças.

Jorge Salgado (posse em 2021)

Salgado tomou posse após uma disputa eleitoral, com duas eleições e inúmeras ações judiciais. Qual o motivo para ele voltar ao clube após a fracassada tentativa no pleito de 1997? A tentativa de resgate do combalido clube. Confira algumas das palavras iniciais:

- Durante o ano passado fiz uma reflexão se eu deveria ser candidato ou não porque mexia muito comigo o fato de que o Vasco passava por um processo de decadência muito perceptível nos últimos 20 anos. Para quem acompanha, era evidência o processo de decadência. Aquilo me incomodava muito. Quando se está de fora, não tem o que fazer. Só criticar.

Enfrentar as dificuldades financeiras e fazer o time ser forte são as promessas principais.

Outras frases de Salgado

- Aceitei o desafio de recolocar o Vasco como potência futebolística, deixar de ser mero coadjuvante para voltar a ser protagonista novamente. Apesar das imensas dificuldades que o clube atravessa, especialmente financeiros, com compromissos em atraso, eu sou bastante otimista olhando para frente. A gente tem uma possibilidade gigantesca de recuperar esse terreno perdido em pouco tempo, de três a seis anos a gente recupera todo esse atraso de 20 anos.

- O que a gente promete daqui para frente é um Vasco diferente, com mais responsabilidade social, fiscal. Nada será feito que a gente não pode pagar no futuro. Tudo será feito dentro do nosso orçamento, vamos seguir isso à risca. A linha mestra será reduzir o endividamento através de renegociação trabalhista, fiscal, credores e bancos. E aumentar o faturamento. Temos o 13º faturamento da Séria A. É pouco para quinta maior torcida. Está desequilibrado. Queremos entregar um clube mais amigável, mais unido, com menos dívida e com mais vitórias. E aberto a todos os sócios. A todas as pessoas que queiram usufruir do clube. Queremos estabelecer uma relação amigável com a mídia. Ao longo desses anos, a mídia não teve o espaço que merecia no Vasco. Espero reconquistá-la.

Fonte: ge