Antonio Lopes: 'Meu relacionamento com o Vasco é desde criança'
Terça-feira, 16/09/2025 - 12:51
Lopes detona escolha por Ancelotti no Brasil: "O treinador não devia ser estrangeiro"


Delegado, preparador físico, treinador e dirigente de futebol, Antonio Lopes agregou todas essas funções ao longo de sua carreira. Multicampeão, o ex-técnico campeão do mundo pelo Brasil em 2002 como coordenador relembrou aquela conquista, falou sobre o convite da CBF e explicou as escolhas daquele elenco pentacampeão.

Na conversa de uma hora na redação da Globo para o Área Técnica, quadro do ge, Lopes montou seu time ideal com um ataque de peso, explicou como domava os bads boys no Vasco, detalhou a relação com Eurico Miranda, lembrou da passagem curta de Emerson Leão na seleção brasileira e criticou severamente a escolha de Carlo Ancelotti como técnico do Brasil.



- Não devia ser contratado esse treinador. O Brasil foi pentacampeão com cinco treinadores brasileiros. Por que vai botar um treinador estrangeiro? Então, o erro foi aí. Não tenho nada contra esse treinador. Mas eu acho que não devia. Um erro da diretoria e do presidente.

- Ele é italiano, né? Ele já foi técnico da seleção da Itália? Não foi. Então, alguma coisa tem de errado aí. Se o cara não foi treinador da seleção italiana, da seleção do seu país... Então, eu acho que tinha que ser um treinador brasileiro.



Copa do Mundo de 2002

Antonio Lopes era o "presidente da comissão técnica", como nomeado pelo então presidente da CBF ao fazer o convite para ser coordenador técnico da seleção brasileira. Lopes relembra que aceitou o convite para a função, mas esperava que o convite seria para assumir o cargo de treinador.

- Eu esperava que eu fosse o treinador. Ele (Ricardo Teixeira) me chamou até lá no sítio dele, era no interior do estado. E quando eu fui para lá, eu estava crente que ia ser para técnico. Quando ele me fez o convite, dizia que eu ia mandar, eu ia ser o presidente da comissão técnica. Foi esse o termo que ele usou. Eu caí um pouquinho, mas ao mesmo tempo, eu digo "pô, eu nunca trabalhei numa seleção e tudo... vou pegar isso mesmo." Aí peguei.

Lopes detalha convite da CBF para ser coordenador: "Eu esperava que eu fosse o treinador"


Ao ser questionado o motivo do atacante Romário não ser convocado para o grupo do Brasil no Mundial de 2002, Antonio Lopes explicou que a escolha foi tomada por Luiz Felipe Scolari. Felipão entendeu que outros atacantes mereciam a vaga. Ele negou problemas na relação com o atacante.

- Quem escolhia mesmo o grupo era o Felipão. Ele escolheu e não tinha ninguém que... A escolha era dele. Às vezes, pedia informação sobre um ou outro jogador, mas a escolha do grupo todo era dele. Não vi problema nenhum.

Lopes, sobre Felipão não levar Romário para a Copa de 2002: "Escolha dele"


Saída de Emerson Leão da Seleção

Antes da chegada de Felipão ao Brasil, Emerson Leão tinha sido o escolhido para o posto, mas teve uma passagem abreviada. Foram apenas 11 jogos, com quatro vitórias, quatro empates e três derrotas. Ele saiu após a campanha ruim na Copa das Confederações de 2001. Segundo Lopes, o principal culpado foi Ricardo Teixeira. O ex-presidente da CBF teria pedido para não levar os titulares e isso diminuiu a qualidade do grupo.

- O Ricardo ligou dizendo "não bota esses titulares não, porque eu vou requisitar a vinda deles antes aí para entregar a vocês, aí então você não faz aí. Não pode chamar." Aí chamou uns jogadores mais inferiores, eu falei com o Leão, o Leão botou os jogadores, coitado. Aí nós fomos mal, perdemos. E aí, o Ricardo mandou tirar o Leão. Sacanagem dele, né? Eu até falei: porra, não faz isso, é sacanagem tua, pô. Você que mandou não convocar os craques, veio um time de segunda divisão. Aí, ele falou: "não, mas tira". Aí, ele já tinha convidado o Felipão para trabalhar. Aí veio. Teve que tirar o Leão.

Lopes não gostou de demissão de Emerson Leão após pedido de Ricardo Teixeira: "Sacanagem dele"


Amor com o Vasco de berço

Vascaíno desde criança. Influenciado pelo pai vascaíno roxo, Antonio Lopes reforçou a relação criada com o clube carioca. Campeão do Brasileiro de 1997 e da Libertadores de 1998 além de outros títulos pelo Cruz-Maltino, Lopes concordou com o posto de maior técnico da história do Gigante da Colina.

- Concordo sim. A gente fica orgulhoso com isso, do time do coração, você passa a ser considerado como o melhor treinador. O que também fortalece um treinador é a conquista dos títulos. Então nós ganhamos, ajudei o Vasco a ganhar muitos títulos e títulos importantes.

- Meu relacionamento com o Vasco é desde criança, né? Meu pai era vascaíno, tremendo vascaíno, era português. Nove irmãos, a gente nascia e meu pai já dava uma camisa do Vasco para a gente vestir. Então, eu sou vascaíno desde guri. E eu sempre frequentava o Vasco, meu pai nos botou logo de sócio do Vasco quando garoto. Eu lembro bem que ele levava a gente aos domingos para o Vasco. Então, era muito bom. Passava um domingo bom sempre, eu e meus irmãos, junto com meu pai – recordou com nostalgia.

Antônio Lopes se declara ao Vasco: "Desde criança vascaíno"


Romário queria vaga de Dinamite no Vasco

Quando subiu para o profissional do Vasco com Antonio Lopes, Romário já se começou a se destacar com muitos gols nos treinos e avisou ao treinador que queria a vaga do ídolo do clube. Roberto Dinamite estava velho, segundo o baixinho, como narra Lopes.

- Eu lembro muito bem que eu passei ele (Romário) para o time de cima para ele começar a jogar, mas ele era banco, né? Aí, uma vez lá, ele falou pra mim: "Pô, professor, Roberto já tá velho, eu já tenho que entrar no lugar dele." "Não, nada disso. Vai devagar que tu vai chegar lá, tu é bom jogador."

- O Roberto era muito bom também. O Romário todo mundo sabe, né? Mas o Roberto era muito bom. Roberto, pra mim, foi um dos grandes jogadores. Ele fazia gol pra caramba também, batia falta, batia pênalti. Ele era completo.

Lopes conta que Romário pediu para assumir titularidade de Dinamite no Vasco: "Roberto já tá velho"


Seleção ideal

Antonio Lopes comandou diversos craques ao longo da sua trajetória no futebol. O ge convidou o técnico para montar o seu 11 ideal entre os jogadores que foram seus atletas. O trio de ataque tem nada menos que Edmundo, Romário e Roberto Dinamite. Veja abaixo:



Antônio Lopes monta a sua seleção ideal com Edmundo, Romário e Dinamite no ataque


Bate-pronto

No quadro, o convidado dá respostas curtas e rápidas sobre tópicos de sua carreira no futebol. Antonio Lopes disse que temia enfrentar o Flamengo e colocou Roberto Dinamite como maior craque que treinou. Ele ainda exaltou Eurico Miranda como seu maior amigo no futebol e melhor dirigente. Veja tudo abaixo:

  • Ídolo da infância? Meu ídolo é Ademir Marques de Menezes.

  • Maior amigo do futebol? Eurico Miranda.

  • Melhor dirigente que trabalhou junto? Eurico.

  • Jogo mais marcante da carreira de treinador? O jogo do final da Libertadores.

  • Título mais importante? Libertadores de 1998.

  • Derrota mais dolorida? Real Madrid 2 x 1 Vasco (final do Mundial de Clubes de 1998).

  • Time que você mais gostava de vencer? Flamengo.

  • Time que você mais temia enfrentar? Flamengo também.

  • Qual o maior clássico que você passou? Vasco e Flamengo.

  • Maior craque que você treinou? Roberto Dinamite.

  • Maior craque que você enfrentou? Neymar.

  • Melhor jogador no Brasil hoje? Vini Jr.

  • Estádio mais bonito que você passou? Maracanã.

  • Torcida que mais fez a diferença pra você? Torcida do Vasco.

  • Torcida adversária que mais incomodava? Acho que a torcida do Flamengo.




Bate-pronto com Antônio Lopes


Íntegra da entrevista

Fase atual do Vasco

- O Vasco conseguiu a classificação para passar mais uma etapa. Eu acho que o time pode melhorar. O Vasco tem um elenco bom, eu acho que está faltando é formar um time. (...) Antigamente a gente começava a construir um time num tempo e levava ainda um tempo para formar, mas agora eles não fazem isso. Eles vendem jogador, não aproveitam os garotos da base, o Vasco sempre teve uma base boa. Quer dizer, não é como antigamente, por isso é que está pecando. O Diniz é bom treinador, tem condições de melhorar mais, mas falta melhorar o time. Mas eu acho que o Vasco tem que lutar. Antigamente todo mundo lutava para ganhar título. Hoje em dia, luta para não ser rebaixado. Então isso é muito ruim, é muito ruim pensar assim, eles pensarem e não trabalharem para isso.

Trabalho na polícia como delegado

- Eu entrei para a polícia em 1963, fiz concurso para a polícia, naquela época era detetive. E aí, começou a minha carreira de policial. Então, eu fiz carreira na polícia também, comecei como detetive, depois fui fazer direito para poder ir a comissário e a delegado. Antigamente, tinha a carreira de comissário. Então, como fiz carreira no futebol, eu fiz carreira na polícia também.

Na polícia prendeu gente ou não prendeu? (risos)

- É, eu tinha que prender (risos) e depois, quando eu era delegado, tinha que autuar muita gente em flagrante, que estava cometendo algum delito, alguma infração. Então, eu fiz de tudo na polícia e depois eu fiz concurso, como já falei também, para comissário, e começou a minha vida de futebol também. Já trabalhei as duas juntas.

Delegado Lopes explica trabalho na polícia: "Tinha que autuar muita gente"


Em 74, você começou ali como preparador. Esse tempo ali da preparação física dentro de uma comissão técnica, que que esse trabalho de comissão te ajudou no futuro quando você virou treinador?

- Ajudou bastante, né? Eu não posso deixar de mencionar, Hélio Vígio que era policial também, era meu colega na polícia, foi o que me colocou na polícia. Foi ele que me convidou para ir para o futebol. Ele sabia que eu tinha me formado em educação física também, educação física saí preparador físico e técnico de futebol, que naquela época a Universidade do Brasil dava também o curso de técnico. Naquela época tinha que passar (pela faculdade). Então, começou ali a minha carreira em 1974. Para poder entrar no futebol, era difícil naquela época você entrar para o futebol, né? Aí, fui convidado pelo Hélio Vígio para entrar como auxiliar dele. Ele era o preparador físico do Vasco, aí eu entrei como auxiliar dele. E como eu era técnico também diplomado, passei a ajudar também o Mário Travaglini. Eu era auxiliar do Hélio Vígio, preparador físico e, ao mesmo tempo, era auxiliar do Mário Travaglini. E ali começou a minha carreira. Eu fiquei um tempão no Vasco de 74, acho que até 80. Trabalhei como auxiliar até 80. Depois trabalhei com Froner, Capitão Froner também, trabalhei com Paulo Emílio também. E fui dando sequência ao meu trabalho no futebol.

Lopes, queria falar um pouco do trabalho do teu filho como treinador. Ele está aí já há alguns anos na função, eu queria entender o que que ele aprendeu contigo. O que você passou de dica? Como é que você avalia?

- Ele não só trabalhou comigo, mas trabalhou com outros treinadores também, como é o caso do Vanderlei Luxemburgo, trabalhou com o Vanderlei um tempão também, trabalhou com o Mano também, ele foi auxiliar. Eu acho que isso é bom pra ele, foi bom pra ele, que a gente vai trabalhando com outros profissionais e vai pegando alguma coisa, né? Peguei muita coisa dos profissionais que eu trabalhei também, depois fiz a minha maneira de trabalhar. E ele é a mesma coisa, né? O Júnior é inteligente, o Júnior é esperto, acompanha tudo.

Você dá umas broncas nele de vez em quando? (risos)

- Não, não dou bronca nele nada (risos). Ele não precisa de bronca. Ele é bom. Ele tá aí, tem trabalhado, como eu trabalhei com vários treinadores. Isso é muito bom. Vai pegando a maneira de um trabalhar, a maneira de outro, depois faz a sua própria maneira de trabalhar. É muito bom. Eu acho que ele é um bom treinador, mas ele precisa pegar um time bom para poder fazer... Eu já falei pra ele, não adianta nada você pegar esses times pequenos aí, que tu não vai chegar a lugar nenhum, o clube sem estrutura fica difícil. Ele é inteligente e é um bom treinador também.



Lopes, você também passou por todos os outros grandes do Rio, o Botafogo foi como gerente. E você passou por Olaria, América. Como é que é a tua ligação com o futebol carioca? Obviamente, o Vasco é o clube que você tem a maior representatividade, mas os outros clubes você passou. Flamengo, Fluminense, o próprio Olaria, onde você começou efetivamente. Como é que foi para você trabalhar nesses clubes cariocas por tantos anos, você que mora no Rio, então, para você é especial?

- Eu acho que foi bom, né? Foi bom pegar esses times do Rio de Janeiro, porque a gente trabalhando no nosso local ajuda também bastante, que você fica mais à vontade do que você trabalhar em outros lugares. Alguns lugares você tem que ir pra lá, tem que levar a família, né? Depois você vai acostumando, né? Vai acostumando, vai trabalhando aqui no Rio de Janeiro, aí eu saí muito, saí por tudo quanto foi estado aí. Para fora do país também, trabalhei no mundo árabe também, como treinador. Eu corri em bastante lugares.

O Vasco é um clube que você treinou em mais de 600 jogos, tem uma história muito grande. Queria primeiro que você falasse um pouquinho do teu relacionamento com o Vasco, com os torcedores, como é que você pode avaliar?

- Meu relacionamento com o Vasco é desde criança. Meu pai era vascaíno, tremendo vascaíno, era português. Nove irmãos, a gente nascia e meu pai já dava uma camisa do Vasco pra gente vestir. Então, eu sou vascaíno desde guri. Já nasci garoto do Vasco. E eu sempre frequentava o Vasco, meu pai nos botou logo de sócio do Vasco quando garoto. Então, ele levava a gente, eu lembro bem que ele levava a gente aos domingos para o Vasco, a gente ia domingo de manhã para São Januário, de manhã tinha o jogo... o juvenil jogava na parte da manhã, a gente ficava assistindo o jogo, depois tinha um aspirante depois de meio-dia, a gente assistia o aspirante, depois assistia o profissional às 15h15. Então, era muito bom. Passava um domingo bom sempre, eu e meus irmãos, junto com meu pai.

Tem uma pesquisa com torcedores do Vasco que apontou você como o maior treinador da história, de todos os tempos do Vasco. Você concorda com essa pesquisa?

- Concordo sim. Eu lembro dessa pesquisa que fizeram. Era o Flávio Costa, que era o bam bam bam do Vasco. Mas aí disseram lá que eu tinha passado à frente dele, né? Então, a gente fica orgulhoso com isso, do time do coração, você passa a ser considerado como o melhor treinador. O que também fortalece um treinador é a conquista dos títulos. Então nós ganhamos, ajudei o Vasco a ganhar muitos títulos e títulos importantes.

Tem alguma fórmula para isso? Porque você ganhou a Libertadores, Brasileiro, Rio-São Paulo, um monte de carioca. Como é que era ali para você principalmente nesses títulos grandes? Como é que foi esse trabalho ali no detalhe?

- Eu pensava sempre na formação dos times bons que eu tive, pegar a garotada da base, os garotos que tivessem mais se destacando, e depois mandava contratar jogadores experientes, que o Vasco estivesse precisando para mesclar com essa garotada da base. Como foi o caso de Mauro Galvão, que nós colocamos lá no Vasco. Como foi o caso dos garotos da base, Felipe, Pedrinho, Géder, um monte de garoto que a gente promoveu. Então, eu procurava fazer sempre essa mescla.



No Vasco, você foi multicampeão, tem mais de 600 jogos, é o clube que as pessoas acabam te ligando mais. Você acha que o Vasco acaba sendo o seu clube, o clube da sua vida, o clube que você tem a representatividade maior?

- Eu acho que sim, né? E pelo fato também da gente ser vascaíno. Eu sou desde criança vascaíno, gosto do Vasco, tô sempre torcendo pelo Vasco, aí quando trabalhava, trabalhava com um gosto maior de você estar dirigindo o clube que você é torcedor. Então, isso tudo facilitou o meu trabalho. Eu acho que facilitou até pra gente ganhar títulos no Vasco. Esse fato da gente ser torcedor do Vasco.

Você treinou muitos craques na tua carreira e eu queria abordar os bad boys da época lá, né? Edmundo e Romário. Como é que era o relacionamento com eles, que têm uma personalidade forte. E você sempre se deu muito bem ali com a dupla, né? Mas como é que era para domar ali o vestiário com os jogadores?

- Era usar de sinceridade com eles, né? Quando assumia sempre um time, principalmente o Vasco, eu chamava os jogadores para conversar, e usar de sinceridade, vamos trabalhar aqui, mas vamos trabalhar sempre, a gente conversando, e por isso eu consegui segurar esses caras. Quando vinha jogador bad boy também... senta aqui, vamos conversar, aqui é isso, isso, isso. Tem que se comportar dessa forma, qualquer coisa fala comigo, não tem problema nenhum e tudo. Então, conversando é que eu sempre me entendia com os jogadores. E bad boy também, a mesma coisa. Trabalhei com um monte de bad boy, mas nunca tive problema nenhum, porque eu sempre conversava muito com eles.

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O Tostão falou em uma entrevista um tempo atrás, que ele acha que lá atrás tinha um certo amadorismo e falta de responsabilidade dos jogadores, que eles saíam muito, iam pra noite toda hora. E aí, eu acho que hoje em dia, por conta das redes sociais, o jogador se contém um pouco mais. Você acha que realmente antigamente tinha mais isso? O jogador às vezes não se preocupava muito e ia realmente para a farra?

- É, eu concordo com o Tostão. Acho que antigamente o jogador não se cuidava tanto como se cuida hoje, né? Ia para as baladas. Hoje em dia não. Hoje em dia, o jogador sabe que está sendo vigiado também, né? Tem câmera pra todo lado, tem que segurar, porque sabe que vai chegar lá o conhecimento de todo mundo.

Eu tenho uma história que eu queria saber se é verdade ou não. Antes do segundo jogo da final do Brasileiro de 97, naquele 0 a 0 com o Palmeiras, parece que teve uma história que o Edmundo fugiu da concentração e que ele sumiu por várias horas. Aí, os dirigentes já estavam tudo louco... onde está o Edmundo? Onde está o Edmundo? Aí, chegou na perto do horário do jogo, algumas horas antes, ele apareceu e ele jogou. Foi isso mesmo? Como é que foi?

- Não. Não teve isso não. Trabalhando comigo, nunca nenhum jogador fugiu de concentração.



Antigamente, os jogadores concentravam mais, ficavam mais tempo juntos. Você acreditava que concentração dava resultado? Como é que eram as suas concentrações?

- Eu achava boa a concentração, porque a concentração você segurava o jogador e depois você passava um monte de troço pra ele, eu pelo menos fazia isso, né? Você passava filme do jogo pra ele.

Rolava uma conexão maior ali com o jogador.

- Isso. Então, eu acho que era bom, a concentração era bom, porque você segurava o jogador, você passava filme, além de ter o jogador por mais tempo junto com você, você tinha essa oportunidade de facilitar mais o jogador, para que ele, naquele jogo, já entrasse com tudo.

O papo era só futebol?

- Era mais o futebol mesmo. Eu tinha a minha mulher, a Elza, que me ajudava muito nisso, porque ela fazia concentração com as mulheres do jogador, chá e tudo ela fazia. E me ajudava muito nesse aspecto.

Ter a mulher do jogador ao teu lado é bom.

- Então, ela ajudava bastante. Ela fazia chá com as mulheres dos jogadores também, então as mulheres dos jogadores passavam muita coisa para ela sobre os maridos e tudo... e ela trazia para mim também isso. E isso ajudava a gente a ajeitar alguma coisa, melhorar alguma coisa, a poder ter o jogador na mão.

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Eu queria abordar uma outra história do Brasileiro de 1999, que foi no último jogo da primeira fase, contra o Botafogo de Ribeirão Preto, que vocês já estavam classificados e o Botafogo já estava rebaixado. E aí, teoricamente o Eurico pediu para jogar o time titular e aí tinha alguns jogadores que não queriam jogar, teve isso? Como é que foi? Você lembra desse jogo?

- O Eurico nunca pedia nada para mim, para eu escalar time. Podia ser com outros treinadores, comigo ele não fazia isso não. Ele não interferia em nada porque ele sabia, ele via até treino, o Eurico acompanhava tudo, então era com facilidade ele fazia a intervenção dele.

Eurico foi o dirigente que mais te acompanhou na carreira, né? Como foi o relacionamento com o Eurico?

- Excelente. Eurico era um cara muito inteligente, né? Qualquer competição que a gente ia disputar, ele já sabia de tudo. Estudava o regulamento e te dizia o que você quer, o que você quer que faça e o caramba. Ajudava muito. Ele fazia acontecer o negócio ali. Ele ajudou muito o Vasco a ganhar título. O Eurico que ajudou o Vasco, justamente por isso, porque ele via, ele pegava o regulamento, antes da competição da gente jogar, ele pegava o regulamento, destrinçava tudo e colocava. Quer começar com esse jogo primeiro, quer depois, como é que é? Ele era fogo. Eurico ajudou muito.

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Eu queria falar sobre a Portuguesa e falar sobre o Dener, que foi um jogador que você ajudou a revelar. Eu queria que você falasse um pouco como é que foi o seu olhar naquele menino que estava começando e você viu que ele era diferente?

- O Dener, eu estava trabalhando na Portuguesa, e chegou um conselheiro lá da Portuguesa, o Mário Fofoca, eu nunca mais esqueci, ele que acompanhava tudo. Aí, ele chegou um dia lá e disse "professor, tem um garoto aí no Juvenil, garoto que joga bem pra caramba, bom jogador. Será que você não poderia dar uma olhada nele, não, pra ver?" Tá bom, não tem problema, manda ele vir aí que a gente vai dar uma olhada. Aí peguei num treino lá, pô, arrebentou, o Dener. Arrebentou. Eu lembro que tinha um zagueiro, que era titular, acho que era Vladimir o nome dele. No primeiro treino lá, ele pegou, deu caneta no Vladimir. Aí eu falei: vai ficar comigo, vai ficar comigo e ficou logo, né? Ficou logo. Aí ele era meio largado, né? Aí o Mário Fofofca falou: "É melhor concentrar esse garoto, botar ele pra morar aí na concentração". Aí, botei ele pra morar na concentração e se destacou, né?

Ele precisava concentrar um pouco mais?

- Precisava, precisava mais, porque ele era garoto, vinha de uma família baixa, né? Aí botamos ele para morar lá na concentração justamente por causa disso. Lá, ele ia se alimentar direito, fazer tudo, aí foi formando o Dener, né?

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Início do Romário

- O Romário foi fácil porque ele já arrebentava no júnior, né? Até no Olaria, que foi o primeiro dele. Ele já veio do Olaria e já veio praticamente pronto. Já fazia gol pra caramba no Olaria, né? Aí depois veio para o Vasco. Então foi fácil o Romário subir logo.

É que ele tinha concorrência do Dinamite na época, né?

- É, tinha concorrência. O Romário sabe por que ele usava a camisa número 11? Eu lembro muito bem que eu passei ele para o time de cima para ele começar a jogar lá no time de cima, mas ele era banco. Aí, uma vez lá, ele falou pra mim: "Pô, professor, Roberto já está velho, eu já tenho que entrar no lugar dele e o caramba." "Não, nada disso. Vai devagar que tu vai chegar lá, tu é bom jogador." Aí, eu lembro que os jogos que a gente ia jogar, ia jogar fora naquela época, o time jogava muito fora, ia fazendo uns jogos amistosos. Aí nós fomos jogar, eu não lembro qual foi o lugar que nós fomos jogar, e ele já foi na reserva, e aí o Silvinho, que era o ponta esquerda, se machucou. Pô, eu vou colocar o Romário. Por isso é que a camisa dele, que era do Silvinho, era ponta esquerda. Era onze, né? Aí ele nasceu com aquela onze. Aí nós colocamos...

Aí ficou Romário e Dinamite juntos.

- E o Mauricinho também. Era Mauricinho, Roberto e Romário. Romário, quando eu fui botar ele na ponta esquerda, ele falou: "Mas eu não sou ponta esquerda". "Não, tu vai ser um atacante pelo lado esquerdo, vai ficar pelo lado esquerdo". Aí ele ficou, né? "Tu marca só até a risca central, não precisa marcar para trás". E eu tinha um meio campo, era Vitor, Geovani e Mazinho. Eu falei pro Mazinho: "Mazinho, do meio-campo para trás, você passa a marcar o lateral, porque o Romário não vai voltar. Eu já falei que ele volta só até a risca central dali, ele não vai". Aí, acertamos, eu jogava praticamente... aí pedi ao Roberto para trabalhar um pouquinho mais por trás, fazer o meio-campo por dentro. Aí, eu ficava com o Mauricinho aberto numa ponta e o Romário aberto na outra, e o Roberto centralizado, mas já vindo como quarto homem de meio de campo. Aí deu tudo certo.

E poder de decisão ali, hein? Romário e Dinamite. Quem você achava que tinha um poder maior?

- O Roberto era muito bom também. O Romário todo mundo sabe, né? Mas o Roberto era muito bom. Roberto, para mim, foi um dos grandes jogadores. Ele fazia gol pra caramba também, batia falta, batia pênalti. Ele era completo.



Você comandou muito cara fora de série, né? Romário, Dinamite, Edmundo, Mazinho, Juninho Pernambucano. Como é que era estar comandando esses caras que eram fora de série? Tinha que ter um trato especial?

- Eles eram fora de série, mas na época que trabalhou comigo ainda não eram, nós que ajudamos, né? Fomos lapidando. Os bad boys chegavam e tinha que ter uma conversa comigo, né? Conversava comigo, eu lembro também quando eu tinha o Edmundo, o Romário tava fora, né? Aí, o Eurico chegou perto de mim e disse: "Quer o Romário? Eu tenho o Romário na mão." "Quero, pô!" "Mas, tem o Edmundo aí, como é que vai ser?" "Não, deixa comigo!" Aí o Romário é malandro pra caramba. Quando ele chegou, o Edmundo que era o capitão do time, era o Edmundo que batia pênalti, né? Aí eu falei pra ele, chamei ele, digo: Romário, eu sei que você gosta de ser capitão, mas é o Edmundo e ele vai continuar como capitão. Aí ele falou: "Não, eu não quero ser capitão não, eu quero ser soldado mesmo." Espertão pra caramba (risos). Quero ser soldado mesmo, aí ficou tudo bem. Ficou tudo bem. Depois que eu saí, que teve um monte de confusão lá.

Eu queria abordar o Juninho Pernambucano, um dos maiores cobradores de falta. Como é que era acompanhar esse treinamento de falta do Juninho? Você ajudou, de alguma maneira, ou ele já tinha aquele dom?

- Ele já tinha. Aquele gol que ele fez contra o River. Ele batia bem na bola, ele que batia as faltas. Um cara muito inteligente, ele era um cara esperto pra caramba, um cara inteligente que fazia tudo. E era um bom garoto, um garoto disciplinado pra caramba, jogava muito. E as faltas era ele que batia mesmo, batia falta que ele chutava forte, chutava bem, sabia bater. E aquilo foi invenção dele mesmo, aquela falta. Foi invenção dele mesmo e acabou dando tudo certo.

Em 1998, Juninho marca o gol de empate "monumental" contra o River Plate pela semifinal da Libertadores


Passagem pelo Internacional, onde foi campeão da Copa do Brasil

- A gente tinha um grupo de jogadores bom. Eu tinha o Gerson e tinha o outro que eu botava na frente com ele. Gerson e Maurício. Eu jogava com os dois enfiados lá na frente e os dois foram bem pra caramba naquela competição, né?

Lopes, avançando um pouco, eu queria que você comentasse um pouco do trabalho da seleção. Primeiro, antes do trabalho, como é que foi quando o Ricardo Teixeira te abordou? Você esperava que ele te abordasse para ser treinador ou como coordenador mesmo? Como é que foi esse papo?

- Eu esperava que eu fosse o treinador. Ele me chamou até lá no sítio dele, era no interior do estado. E quando eu fui para lá, eu estava crente que ia ser para técnico. Ele me chamou, eu estava no Athletico Paranaense. Era num jogo até do Athletico e Ponte Preta. Aí, eu atendi o telefone, era ele, eu estava até dentro do vestiário. Eu saí para conversar com ele. "Ah, eu quero falar contigo e pá, será que você pode segunda-feira vir falar comigo aqui?" Eu digo: está legal, vou sim. Aí, eu estava crente que era para ser o técnico da Seleção. Aí, quando ele me fez o convite, dizia que eu ia mandar, eu ia ser o presidente da comissão técnica. Foi esse o termo que ele usou. Eu caí um pouquinho, mas ao mesmo tempo, eu digo "pô, eu nunca trabalhei numa seleção e tudo... vou pegar isso mesmo. Aí peguei. Ele disse: "ah, você toma conta de tudo lá" e no início eu tava tomando conta mesmo. Até chamei o Leão, passei o treinador. O Leão trabalhou lá um tempo com a gente.

O que você acha que não deu certo com o Leão?

- Estava dando certo, mas o culpado foi o próprio Ricardo Teixeira. O Ricardo ligou dizendo: "não bota esses titulares não, porque eu vou requisitar a vinda deles antes aí para entregar a vocês, aí então você não faz aí. Não pode chamar." Aí chamou uns jogadores mais inferiores, eu falei com o Leão, o Leão botou os jogadores, coitado. Aí nós fomos mal, perdemos. E aí, o Ricardo mandou tirar o Leão. Sacanagem dele, né? Eu até falei: porra, não faz isso, é sacanagem tua, pô. Você que mandou não convocar os craques, veio um time de segunda divisão. Aí ele falou "não, mas tira". Aí ele já tinha convidado o Felipão para trabalhar. Aí veio. Teve que tirar o Leão.

Nessa seleção, você tinha passado pelo Athletico Paranaense, você comentou numa entrevista recente o teu papel na convocação do Kleberson. Como é que foi?

- O Felipe não conhecia, eu que falei pra ele, a gente tá precisando aí de um jogador igual a esse aí. Ele já tinha me mostrado os jogadores que ia convocar. Convoca esse jogador, que esse jogador é bom. "Pô, mas eu não conheço, nem o Murtosa conhece." "Mas eu conheço, pô!" Aí ele convocou. Deu tudo certo. Foi importante para burro. Muito bom. Bom jogador pra caramba.

O que você viu nele diferente?

- Era um jogador que marcava bem e tinha boa técnica, saía bem para o jogo. Ele era completo, era um jogador excepcional.

Antônio Lopes exalta papel de Kleberson na Seleção: "Era um jogador excepcional"


Você estava muito ali no dia a dia dos jogadores no vestiário. Como é que era a resenha do grupo ali da seleção? Você acha que o ambiente ajudou naquela conquista?

- Ajudou, acho que ajudou tudo do grupo, mas eu acho que o Felipe também ajudou muito. Felipe trabalhou bem, Felipe é um treinador muito bom. Um treinador de grupo que gosta de harmonizar o grupo, de ter o grupo na mão, de puxar para ele tudo. Eu acho que o Felipe foi muito importante ali, mas os outros também foram e os jogadores foram muito importantes.

Ele puxava muito a responsabilidade, porque teve aquela polêmica questão do Romário da convocação. O público brasileiro todo pedindo Romário e ele bancou de não chamar. Ali na comissão técnica, quais os principais motivos para trazer outros e não trazer o Romário? Teve uma discussão ali para poder chegar nesse consenso?

- Não porque quem escolhia o grupo era o Felipão, né? Ele escolheu e não tinha ninguém que... A escolha era dele. Às vezes, pedia informação sobre um ou outro jogador, mas a escolha do grupo todo era dele.

Mas teve algum problema com o Romário?

- Não, não vi problema nenhum.



Você acha que o grupo, quando ele chegou ali para concentrar para a Copa do Mundo, você viu alguma coisa diferente?

- É porque foi encaixando, o futebol tem isso. Você vai trabalhando, vai trabalhando e a coisa vai se encaixando e vai melhorando. Foi o que aconteceu, o troço foi encaixando aos poucos, os jogadores e a formação do grupo. Foi aos poucos se encaixando tudo e acabou dando certo.

Trazendo agora para a seleção de hoje, qual que é a tua avaliação até agora? A gente está aí classificado para a Copa do Mundo, mas foi a pior campanha desse formato das Eliminatórias. Você acha que a gente até se assemelha um pouco com 2002 que não estava tão acreditado e deu liga. Você acha que ainda dá tempo ali de dar liga?

- Eu acho que foi tudo errado ali. Primeiro o treinador. Não devia ser contratado esse treinador. O Brasil foi pentacampeão com cinco treinadores brasileiros. Por que vai botar um treinador estrangeiro? Eu falei isso. Então, o erro foi aí. Não tenho nada contra esse treinador. Mas eu acho que não devia, pô. Pra que vai trazer um treinador estrangeiro se o Brasil foi pentacampeão com cinco treinadores brasileiros? E tem bons treinadores aí trabalhando aí que dá. Então, eu acho que foi um erro. Um erro da diretoria e do presidente.

- Eu acho que foi feita uma escolha errada para o treinador. O treinador não devia ser estrangeiro não, tinha que ser brasileiro. Não acredito muito nele não. Ele é italiano, né? Ele já foi técnico da seleção da Itália? Não foi. Então, alguma coisa tem de errado aí. Se o cara não foi treinador da seleção italiana, da seleção do seu país, né? Então, eu acho que tinha que ser um treinador brasileiro.



Em relação aos jogadores que estão hoje no grupo. Você acha que esse grupo atual dá para conseguir alguma coisa?

- Eu acho que dá. Eu acho que esses jogadores podem crescer com o tempo, como a seleção de 2002 foi crescendo aos poucos, os jogadores foram se destacando aos poucos, foram subindo aos poucos. E eu acho que agora tem bons jogadores aí para eles crescerem aí. O Vini joga pra caramba, bom jogador pra caramba, ele pode melhorar aí, melhorar e subir mais, eu acho que tem outros jogadores, Raphinha, outros jogadores que têm se destacado lá fora, têm feito gol pra caramba, então acho que podem. Os jogadores podem crescer aí e acabar formando uma boa seleção também.

Avaliação da carreira

- Eu acho que a minha carreira foi boa. A gente analisa pelos títulos, né? Não adianta nada você fazer um bom trabalho só. Então, eu acho que pelos títulos que eu tive, que eu trabalhei, eu me considero ter sido um bom treinador.

Desses títulos todos que você teve, qual que você acha que foi o mais difícil?

- Eu acho que o título da Libertadores. O mais importante e o mais difícil de concentrar pelos adversários que nós tivemos pela frente.



Lopes, eu queria que você falasse um pouco como que esse ambiente do futebol, que é uma pressão constante por resultado. Como é que ficou a tua saúde nesse ambiente? Você acha que o ambiente do futebol para o treinador é prejudicial para a saúde?

- Eu acho que é estressante para o treinador. Acho que pode atrapalhar um pouquinho a saúde. Você tem que estar sempre se policiando, atento para poder não sofrer tanto.

Em 99, teve aquele problema no coração, não foi? Isso foi futebol ou já era uma coisa genética?

- Não era genética não, eu não sei também se foi futebol. Pode ter contribuído alguma coisa,, mas eu não sei, não posso afirmar.

Mas hoje está 100%?

- Tá, tá 100%. Eu botei uma mamárea. Faço acompanhamento.

Hoje você está com 84 anos. Tua história no futebol já foi construída por muitos e muitos anos. Você acha que ainda tem mais algum capítulo de alguma coisa ou está de boa?

- Não, está de boa, eu acho que a gente tem que dar vez para os mais novos que tem que aparecer.

Fonte: ge